A casa do meu amigo poeta também tinha as suas
particularidades.
Era muito pequena, com divisões minúsculas. Na
sala, o tecido do sofá apresentava uma boa meia dúzia de buracos bem grandes,
deixando à vista o estofo. Livros, revistas e pilhas de papéis acumulavam-se
nas estantes que cobriam quase todas as paredes, por vezes em fileiras duplas,
deixando pouco espaço a quem quisesse caminhar por entre eles. Os
electrodomésticos estavam todos a precisar da reforma e havia ali muito mais pó
do que em qualquer outra casa que eu tinha visto até hoje. Por vezes, havia
latas de cerveja ao redor do gira-discos e vinis espalhados pelo chão sem
cuidado algum. Na cozinha, a loiça suja acumulava-se. O fogão estava já negro
devido aos molhos que ali foram solidificando, queimando e requeimando com o
passar do tempo. O forno tinha pedaços de comida encrostados em tudo o que era
canto. O chão era de madeira, mas tinha-se a impressão de caminhar sobre
cabelos e pó, tal era a sua profusão ali.
Era uma casa escura, com poucas janelas, e as
persianas estavam sempre corridas.
Surpreendentemente, a varanda era enorme e
arejada. Corria sempre ali uma brisa fresca e suave. E a vista, apesar de não
incidir em nada particularmente belo, não deixava de ser agradável.
Pode dizer-se, talvez, que a casa do meu amigo
poeta o reflectia na perfeição.
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