20 agosto 2012

o meu amigo poeta (VIII)


A casa do meu amigo poeta também tinha as suas particularidades.

Era muito pequena, com divisões minúsculas. Na sala, o tecido do sofá apresentava uma boa meia dúzia de buracos bem grandes, deixando à vista o estofo. Livros, revistas e pilhas de papéis acumulavam-se nas estantes que cobriam quase todas as paredes, por vezes em fileiras duplas, deixando pouco espaço a quem quisesse caminhar por entre eles. Os electrodomésticos estavam todos a precisar da reforma e havia ali muito mais pó do que em qualquer outra casa que eu tinha visto até hoje. Por vezes, havia latas de cerveja ao redor do gira-discos e vinis espalhados pelo chão sem cuidado algum. Na cozinha, a loiça suja acumulava-se. O fogão estava já negro devido aos molhos que ali foram solidificando, queimando e requeimando com o passar do tempo. O forno tinha pedaços de comida encrostados em tudo o que era canto. O chão era de madeira, mas tinha-se a impressão de caminhar sobre cabelos e pó, tal era a sua profusão ali.

Era uma casa escura, com poucas janelas, e as persianas estavam sempre corridas.

 Surpreendentemente, a varanda era enorme e arejada. Corria sempre ali uma brisa fresca e suave. E a vista, apesar de não incidir em nada particularmente belo, não deixava de ser agradável.

Pode dizer-se, talvez, que a casa do meu amigo poeta o reflectia na perfeição.

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